A Torre-de-Vigia Branca

Este artigo é um capítulo de O Templo do Rei Salomão

Uma extensa biografia mágica baseada no diário de Frater Perdurabo.

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A Torre-de-Vigia Branca

O Caos e a noite ancestral me engoliram; estou cego. Eu me inclino sobre a torre do extremo silêncio aguardando a chegada dos exércitos da aurora.

Ó, de onde venho, onde estou, Ó, aonde vou? Pois eu sento enlouquecido pelos terrores de uma grande escuridão. ... O que eu ouço? Palavras de mistério flutuando ao meu redor, uma música de vozes, uma doçura, como se de uma longínqua queima de incenso; sim! eu vejo, eu ouço, eu sou apanhado nas asas da canção. No entanto, eu duvido, e duvido que eu duvide ... Eu contemplo!

Veja! a noite se ergue como uma grande mulher com uma criança, e a superfície das águas negras brilha como a pele trêmula de alguém sentindo a agonia das dores de parto. ... O horizonte está rachado e brilha como um ventre de fogo, as hostes da noite são dispersas, eu nasci, e as estrelas se derreteram como flocos de neve diante dos meus olhos. ...

Vê! lá está ela, nascida em maturidade, escapada dos quadris da escuridão, como um arco-íris das jarras púrpuras do trovão. Seu cabelo é como um fluxo de dançantes raios lunares, tecido com douradas espigas de milho, e preso por serpentes brilhantes de malaquita e esmeralda. Em sua fronte resplandece a lua crescente, como uma pérola, e brilhando suavemente com a luz de uma luz interior. Seu vestido é como uma teia translúcida prateada, de branco cintilante e como o orvalho, ora ondulando com todas as cores do arco-íris, ora correndo em chamas carmesim e douradas, como as pétalas da rosa vermelha, tecido com papoula, e açafrão, e tulipas. E em torno dela, como uma nuvem de irradiante mistério brilhando com a escuridão, e em parte obscurecendo a suavidade de sua forma, varre uma túnica, tecida de uma rede de águas sombrias, e piscando com uma miríade de estrelas de prata; e em seu meio, como uma grande pérola de fogo tirada das profundezas dos mares, uma lua cheia de prata treme brilhando com raios de luz opalescente – mística e maravilhosa. Em sua mão direita ela segura um sistro, e badala a música da terra, e na esquerda uma víbora torcida para a proa de um barco de ouro, onde se encontram os mistérios do céu.

Em seguida, clara e doce como o sopro da encosta, eu ouvi uma voz, como se de ventos através de uma harpa de prata, dizendo:

Eu sou a Rainha dos celestiais, dos Deuses, e das Deusas, unidos em uma forma. Eu sou Aquela que foi, que é, e que será; a minha forma é uma, meu nome são muitos; sob as palmeiras, e nos desertos, nos vales e nas montanhas nevadas, a humanidade presta-me homenagem, e troveja louvores em meu nome. Contudo nas profundezas eu sou sem nome, assim como entre as luminosas montanhas do céu. Alguns me chamam de Mãe dos Deuses, alguns de Afrodite dos mares de pérolas, alguns de Diana das redes de ouro, alguns de Proserpina a Rainha das Trevas, alguns de Hécate senhora dos encantos, alguns de Istar do barco da noite, alguns de Miriam da Caverna, e outros ainda de Isis, a mãe velada do Mistério.

Eu sou aquela que chega a todos os homens, e se não aqui, então tu Me contemplarás em meio à escuridão do Aqueronte, e como Rainha nos palácios do Estige. Eu sou a noite escura que dá a luz ao dia claro; eu sou o dia brilhante que engole a noite escura; aquele luminoso dia que foi gerado pelas eras, e concebido nos corações dos homens; aquele amanhecer no qual as tempestades cessarão o seu rugido, e as ondas do abismo serão aplainada como uma folha de vidro fundido.

Então eu fui arrebatado nas asas do êxtase, e na força de minha alegria eu saltei da torre da Noite; mas conforme eu caí, ela me pegou, e eu me agarrei a ela e ela se tornou como uma Filha deste mundo, como um Filho de Deus gerado no coração do homem. E seu cabelo caía ao meu redor e sobre mim, em nuvens de ouro, e rolava sobre mim, como raios de sol se derramam dos copos do meio-dia. Seu rosto era brilhante com um suave cinabre de romã misturando-se com a brancura do lírio. Seus lábios estavam entreabertos, e seus olhos eram profundos, apaixonados, e trêmulos, como os olhos da mãe da raça humana, quando ela lutou nos braços fortes do homem; pois eu estava crescendo forte em sua força, eu estava me tornando um parceiro digno de sua glória.

Então ela agarrou-se a mim, e sua respiração deixou seus lábios como rajadas de fogo misturadas com o odor de murta; e em meus braços ela cantou para mim sua canção nupcial:

“Vem, ó meu querido, meu bem-amado, passemos da terra do arado para as clareiras e os bosques do prazer! Lá que derrubemos as emaranhadas vinhas de nosso tremor, e que espalhemos as pétalas de rosas de nosso desejo, e que pisoteemos as uvas roxas de nossa paixão, e que misturemos os copos espumantes de nossa alegria no cálice brilhante de nosso amor. Ó! o amor, o que jorra de êxtase, o que brota da inebriante felicidade além das profundezas de nosso ser, até que o vinho espumante jorre sibilante através das chamas da nossa paixão – e respingue na imensidão, gerando um milhão de sóis.

“Eu assisti o amanhecer, dourado e carmesim; eu assisti a noite toda de olhos estrelados; eu bebi as profundezas das águas azuis, como o suco púrpura da uva. No entanto, só em teus olhos, eu encontro as delícias de minha alegria, e em teus lábios a vindima de meu amor.

“As flores dos campos eu contemplei, e as plumagens de cores vivas dos pássaros, e o distante azul das montanhas; mas todos eles desaparecem perante o corar de teu rosto; e assim como o cálice de rubi do Sol é drenado pelos lábios prateados da noite, também são todos engolidos no excesso de tua beleza.

“Eu respirei o cheiro de rosas e a fragrância de murta, e o doce aroma do jasmim selvagem. Eu bebi no sopro da encosta, e do perfume dos bosques e dos mares; teu sopro ainda é mais perfumado do que eles, é mais doce ainda, me intoxica e me enche de alegria, como um rico jarro de vinho encontrado nas profundezas de um deserto de sal – eu bebi fundo e estou perplexo com o amor.

“Eu ouvi à cotovia no céu, ao maçarico, e ao rouxinol no matagal, e a todas as toutinegras dos bosques, a ao murmúrio das águas e ao cantar dos ventos, contudo o que eles são diante do êxtase de tua voz? que ecoa no vale de meu peito, e gorjeia através das profundezas do meu ser.

“Eu provei o suco de pêssego, e a doçura do mel e do leite; mas o vinho dos teus lábios é forte como a aromática vindima do Egito, e doce como o suco das tamareiras nas planícies perfumadas do Eufrates: Sim! deixe-me beber até que eu cambaleie perplexo com beijos e prazer ... Ó meu amor! ... meu amor! ... Ó meu amor! “

Então eu suspendi a sua canção e clamei: “Sim! Ó Rainha da Noite, Ó flecha de brilhante traçado da aljava da lua! Ó Tu que me enlaçaste nas malhas de teu cabelo, e me apanhaste nos beijos de tua boca; Ó tu que pusestes a tua divindade de lado para se refugiar em meus braços, ouça!

“Eu bebi profundamente dos garrafões da paixão com as virgens brancas e veladas de Vesta, e as filhas cingidas-de-vermelho de Circe, e as moças de olhos sonolentos de Ind. Eu teci amor com as ágeis garotas de Hellas, e as mulheres de pernas sutis do Egito cujos dedos foram criados para as carícias; todas as virgens da Assíria, e as belas veladas da Arábia, foram minhas; ainda assim entre todas elas eu não achei uma que se compare a um cílio da pálpebra de teus olhos. Ó Tu és como o vinho de êxtase, mil vezes mais delicioso do que todos estes. Ah! mas o que é esta fraqueza que se une a mim? Minha força me deixou; minha alma se misturou com a tua; eu não sou, e ainda sou. É a Tua fraqueza que eu sinto?”

“Não, Ó amante, pois é somente com o preço da ilusão de minha força que me destes o prazer da unidade que eu provei em teus braços. A beleza conquistou-me e bebeu da força do meu poder; eu estou só, e todas as coisas são minhas no mistério de minha solidão.

Evoe! a vida queima no braseiro do amor como uma chama de rubi em uma tigela de safira. Estou morta, embora viva para sempre!”

Levanta-te, Ó dormente, pois a noite da solidão envolveu as cortinas de seu leito, e meu coração está queimando como um sol de bronze fundido; acorde antes que a Besta se levante e entre no santuário do Éden e contamine os filhos da aurora. Tu Filho-do-Homem, rejeitai o manto dos sonhos que antes do teu sono era encantado com a força do amor. Belo e refrescado viestes dos bosques quando o mundo era jovem, com o peito como os montes de neve ao sol, e os teus cabelos como uma floresta de carvalho violada pelo vento, e os teus olhos profundos e serenos como os lagos das montanhas. Nenhum véu te cobriu, e tu te deleitastes nu na risada da Aurora, e sob os beijos do meio-dia saltaste com o sol, e as mãos acariciantes te puseram a repousar no berço da lua. Pensamentos não te tentaram, a Razão não falaste contigo, nem a imaginação o lascivo. Uma criança radiante como tu és, tu crescestes na luz que brilhou dos teus olhos, nenhuma sombra de escuridão cruzou com teu caminho: teu amor foi forte e puro – brilhante como as estrelas da noite, e profundo como as ecoantes profundezas das colinas de âmbar, e de esmeralda, e de cinabre.

Desperta! rasga de teus membros as cordas de cânhamo das trevas, levanta-te! – incendeia o farol do despertar das nações, e a noite suspirará como uma grande prostituta grávida, e a pureza nascerá da corrupção, e a luz palpitará através das trevas, um brilho de opalas como raios de muitas cores irradiados da L.V.X.

Através da noite de acerto de contas tu passastes, e teu caminho se enrolou em torno da terra da escuridão sob as nuvens do sono. Tu fendeste no horizonte como um bebê no ventre de sua mãe, e dispersou a escuridão da noite, e gritaste em tua alegria: “Que haja a luz!” Agora que tu dominastes o trono, tu passaste dos portais da tumba e entrastes no Templo além.

Ali tu te levantarás sobre a grande torre-de-vigia do Dia, onde tudo é despertar, e olharás o reino da videira e a terra das casas de frieza. Tu conquistarás o Império do Cetro, e usurparás o Reino da Coroa, pois tu és como uma criancinha, e nada te prejudicarás, nenhuma forma maléfica surgirá contra ti. Pois o Ontem está na tua mão direita, e o Amanhã na tua esquerda, e o Hoje é como o sopro de teus lábios. ........

Eu sou o Desvelado entre os dois horizontes, como o sol entre os braços do Dia e da Noite. Minha luz resplandece sobre todos os homens, e ninguém pode me causar mal, nem pode a influência de minha regra ser quebrada. Eu sou o Desvelado e o Desvelador e o Revelador; o mundo jaz abaixo de mim e diante de mim, e no brilho dos meus olhos rastejam as imagens das coisas que são. Eu desenrolo o Espaço como um pergaminho, e badalo o Tempo de minha mão como a voz de um sino de prata. Eu ressoo o nascimento e a morte de nações, e quando eu me ergo mundos falecem como plumas de fumaça diante do furacão. .....

No entanto, Ó Jovem divino que criastes a ti mesmo! O que és tu? Tu és o não-nascido e o imortal, sem começo e sem fim! Tu pintastes o céu brilhante com raios de pura luz esmeralda, pois tu és o Senhor dos raios de Luz. Tu iluminastes as duas terras com raios de turquesa e berilo, e safira, e ametista; pois Senhor do Amor, Senhor da Vida, Senhor da Imensidão, Senhor da Eternidade é teu nome. Tu te tornastes como uma torre de Esplendor, cujos alicerces estão postos nos corações de mim, sim! como uma montanha de crisólito adormecida na Coroa da Glória! cujo ápice é Deus!

[O Livro II “Os Andaimes” aparecerá no Nº 2.]


Traduzido por Frater V.I.T.R.I.O.L.

Próximo capítulo em breve!
Livro 2 »
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