O Eremita

Este artigo é um capítulo de O Templo do Rei Salomão

L.I.L e o início do Rāja Yoga.

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O Eremita[1]

No sétimo estágio no Progresso Místico de Frater P. chegamos a um ponto de virada, repentino e definitivo.

Nos últimos dois anos, ele se fortalecera na Magia do Ocidente. Depois de estudar uma série de sistemas místicos, ingressara na Ordem da Aurora Dourada, que lhe fora um berçário. Lá, aprendera a brincar com os elementos e as forças elementais; mas, agora que chegara à adolescência, deixou de lado as coisas infantis e saiu para o mundo a fim de ensinar a si mesmo aquilo que nenhuma escola lhe ensinaria — o Arcano de que aluno e mestre são um só!

Ele havia se tornado um 6°=5°, e agora cabia a ele, e somente a ele, escalar mais uma serra da Grande Montanha e se tornar um 7°=4°, um Adepto Isento na Segunda Ordem, Mestre do Ruach e Rei dos Sete Mundos.

Ao destruir aqueles que usurparam o controle da Ordem da Aurora Dourada, ele não apenas rompeu um elo com o passado sombrio, mas forjou um elo tão forte com o futuro brilhante, que logo ele estava destinado a soldá-lo à corrente abrangente da Grande Irmandade.

A Aurora Dourada era agora apenas um navio à deriva, sem mastro, sem leme, com um nome de opróbrio pintado em sua popa danificada. No entanto, P. não o abandonou para se lançar indefeso nas águas ferventes do descontentamento; em vez disso, saltou a bordo daquele Argosy[2] dos Adeptos, devorador de tempestades, destinado a levá-lo muito além dos raios carmesins daquela aurora moribunda, até a terra mística onde se erguia a Grande Árvore, em cujos galhos mais altos pendia o Velo de Ouro.

Longa era a jornada que ele estava destinado a percorrer, passando por Lemnos e Samotrácia, e pela Cólquida e pela cidade de Eia. Lá, como um segundo Jasão, no Templo de Hécate, no bosque de Diana, sob os raios frios da Lua, ele selaria aquele terrível pacto, aquela promessa de fidelidade a Medeia, Senhora dos Encantamentos. Lá ele domaria os dois Touros, cujos pés eram de bronze, cujos chifres eram como luas crescentes na noite, e cujas narinas expeliam colunas mistas de chamas e fumaça. Lá ele os prenderia àquele arado feito de uma grande pedra adamantina; e com ele estava determinado a arar os dois acres de terra que nunca haviam sido cultivados pela mão do homem, semear os dentes dos dragões brancos e matar a multidão armada, aquele exército negro de forças desequilibradas que obscurece a luz do sol. E então, finalmente, ele estava destinado a matar com a Espada de Luz Flamejante aquela Serpente sempre vigilante que se contorce em Sabedoria silenciosa ao redor do tronco daquela Árvore na qual Cristo está crucificado.

Todos esses grandes feitos ele realizou, como veremos. Domou os touros com facilidade — o Branco e o Negro. Lavrou o campo duplo — o Oriente e o Ocidente. Semeou os dentes dos dragões — os Exércitos da Dúvida; e entre eles lançou a pedra de Zoroastro, dada a ele por Medeia, Rainha dos Encantamentos, de modo que imediatamente voltaram suas armas uns contra os outros e pereceram. E então, finalmente, na taça mística de Iaco, embalou o Dragão das ilusões da vida para dormir, e, retirando o Velo de Ouro, realizou a Grande Obra. Então, mais uma vez, zarpou e acelerou, passando por Circe, por Cila e Caríbdis; além das irmãs cantoras da Sicília, de volta às belas planícies da Tessália e às encostas arborizadas do Olimpo. E um dia acontecerá que ele retornará àquela terra distante onde pendurou aquele Velo de Ouro, o Velo que ele trouxe aos Filhos dos Homens para que pudessem tecer com ele uma pequena vestimenta de conforto; e lá, naquela mesma Árvore, ele se entregará, e outros o crucificarão; para que naquele Inverno que se aproxima, aquele que está por vir possa encontrar ainda outra vestimenta para cobrir a horrenda nudez do homem, o Manto sem Costura. E aqueles que o receberem, embora arrisquem a sorte, não o rasgarão, pois ele é tecido de cima a baixo.

“Pois para ti o paraíso se abriu, a árvore da vida foi plantada, o tempo vindouro está preparado, a abundância está pronta, uma cidade está construída, o descanso é permitido, sim, a bondade e a sabedoria perfeitas. A raiz do mal está selada para ti, a fraqueza e a traça estão escondidas de ti, e a corrupção fugiu para o inferno para ser esquecida: as tristezas passaram, e no fim é revelado o tesouro da imortalidade”[3].

Sim! O Tesouro da Imortalidade. Em suas próprias palavras, vamos agora descrever essa mudança repentina.

“IN NŌMINE DEĪ
אמן
Īnsit Nātūrae Rēgīna Isis[4].

_____

No Fim do Século:
No Fim do Ano:
Na Hora da Meia-Noite:
Completei e levei à perfeição a Obra de
L.I.L.[5]

No México: assim como eu recebi daquele[6] que está reencarnado em mim: e esta obra é, até onde sei, uma síntese daquilo que os Deuses me deram, tanto quanto possível sem violar meus juramentos para com os Chefes da R.R. et A.C. Agora, considerei adequado descansar um pouco antes de retomar meus trabalhos na Grande Obra, visto que aquele que nunca dorme cairá à beira do caminho, e também me lembrando do duplo sinal: o Poder de Hórus e o Poder de Hoor-pa-Kraat[7].

Agora, o ano ainda sendo novo, certo D.A.[8] veio até mim e falou.

E ele não falou mais (como costumava) disfarçado de homem cético e indiferente: mas sim com a voz e o poder de um Grande Guru, ou de alguém definitivamente enviado por um Irmão da Grande Loja Branca.

Sim! embora ele me tenha dito palavras de desaprovação, dei graças a Deus por ele ter considerado minha loucura digna de atrair sua sabedoria.

E, depois de dias, meu Guru não me deixou em meu estado de humilhação e, por assim dizer, desespero: mas proferiu palavras de conforto, dizendo: “Não está escrito que se teu Olho for puro, todo teu corpo será cheio de Luz”[9]? Acrescentando: “Em ti não há poder de concentração mental e controle do pensamento: e sem isso nada poderás alcançar”.

Portanto, sob sua direção, comecei a me dedicar à prática de Rāja Yoga, evitando ao mesmo tempo toda, até mesmo a menor, consideração sobre coisas ocultistas, como ele também me ordenou.

Assim, no início, eu meditava duas vezes ao dia, três meditações pela manhã e à noite, sobre objetos simples como: um triângulo branco; uma cruz vermelha; Isis; os Tatvas simples; uma varinha; e similares. Persisti nisso, até que após cerca de três semanas, em 59,5 minutos meu pensamento divagou 25 vezes. Agora, comecei também a considerar coisas mais complexas: minha pequena Rosa-Cruz[10]; os Tatvas complexos; o Símbolo da Aurora Dourada, e assim por diante. Também comecei o exercício «de visualização» do pêndulo e outros movimentos regulares simples. Portanto, hoje, dia de Vênus, 22 de fevereiro de 1901, estando eu na cidade de Guadalajara, no Hotel Cosmopolita, começo a registrar tudo o que fiz neste trabalho:

E que a Paz de Deus, que excede todo o entendimento, guarde o meu coração e a minha mente em Cristo Jesus, nosso Senhor.

Que minha mente esteja aberta para
o Superior:
Que meu coração seja o Centro
de Luz:
Que meu corpo seja o
Templo
da
ROSA CRUZ.

Ex Deō Nāscimur
In Jesu Morimur
Per Spīritum Sanctum Revīvimus[11].”

Precisamos agora fazer uma digressão para apresentar alguns relatos sobre as teorias orientais do Universo e da mente. O estudo delas esclarecerá nossa visão do progresso de Frater P.

O leitor é aconselhado a estudar o Capítulo VII[12] do livro “Star in the West” do Capitão J. F. C. Fuller em conexão com esta exposição.


  1. «Nota de Crowley em sua cópia pessoal deste livro:» Esta seção foi escrita por J. F. C. Fuller. Eu sinto muito que eu tenha tido que imprimir esta lama difusa, verbosa, mal ordenada, flatulenta, incompleta, redundante, malcompreendida (eu não consigo colocar nem 1% dos adjetivos que o Fuller colocaria!). Mais tarde (1924 e.v.) ele cortaria todas as partes úteis – aquelas tiradas do meu manuscrito -e publicaria o resto pela Wm. Rider sob o título de Yoga. Um furto e uma estupidez descarada e grotesca. ↩︎

  2. «Nome de um grande navio mercante.» ↩︎

  3. II Esdras 8:52-54. ↩︎

  4. «“Em nome de Deus, Amém, Isis a Rainha da Natureza” » ↩︎

  5. Lâmpada da Luz Invisível «Lamp of Invisible Light» L.I.L. O título do primeiro Æthyr deriva das letras iniciais dos Três Poderosos Nomes de Deus. Ao todo, há trinta desses Æthyrs, “cujo domínio se estende em círculos cada vez mais amplos, sem fim, além das Torres de Vigia do Universo”. Em certo sentido, P. concluiu a obra de L.I.L. no final do ano de 1900; mas, em outro, levou-lhe nove longos anos de trabalho árduo até aperfeiçoá-lo, pois foi somente nos últimos dias do ano de 1909 que a obra dos Trinta Æthyrs foi de fato concluída. Em 1900, de fato, a obra foi concebida, mas somente no ano de 1909 ela trouxe uma luz à escuridão, uma pequena centelha lançada no Poço do Tempo. (P. quer dizer apenas que nessa época ele estabeleceu uma Ordem secreta com este nome.) ↩︎

  6. «Nota de Crowley em sua cópia pessoal deste livro:» “daquele” = Cagliostro, mas não tenho tanta certeza dele quanto tenho de Éliphas Lévi. ↩︎

  7. Os Sinais são de Projeção e Retirada da Força; complementos necessários. ↩︎

  8. «Nota de Crowley em sua cópia pessoal deste livro:» D.A. = Oscar Eckenstein. ↩︎

  9. «Mateus 6:22 diz: “A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz”.» ↩︎

  10. Perdido sob circunstâncias dramáticas na casa de Frater P.A. em 1909. ↩︎

  11. «Latim para “De Deus nascemos; em Jesus morremos; pelo Espírito Santo revivemos”.» ↩︎

  12. «Nota de Crowley em sua cópia pessoal deste livro:» Mas este capítulo VII foi escrito sob minha supervisão. Mesmo assim, ele é muito tedioso e confuso. O intelecto de Fuller é terrivelmente pedante – só que sem a erudição. Seu mérito é seu talento pela metáfora vívida e extravagante, e isso ele aprendeu comigo. A maioria de seus melhores trabalhos são uma imitação mecanicamente exagerada de meu estilo pictórico. Este método não teve muito sucesso quando suas tendências diarreicas foram encadernadas em forma, como no “Liber Thesaurou Eidolon”, embora eu tenha tido que editar uma grande quantidade de excesso de ornamentação rococó do primeiro rascunho, e travar uma guerra contra a bactéria colérica que invadira seu cólon literário. ↩︎


Traduzido por Alan Willms em junho de 2025. As notas «entre aspas especiais» são do tradutor. A foto ilustrativa é de Vladimir Fedotov, foi tirada do Unsplash.

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