O Esbanjador

Este artigo é um capítulo de O Templo do Rei Salomão

Sobre o Panteísta.

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O Esbanjador
«ou o Panteísta»

“Arcadia, noite, uma nuvem, Pã e a lua”. Que palavras para se conjurar, que cinco gritos para matar os cinco sentidos e lançar uma chama saltitante de esmeralda e prata dançando sobre nós enquanto as gritamos sob os carvalhos e sobre as rochas e murtas da encosta da colina. “Ferido no peito de Pã” – fujamos da igreja, da capela e da sala de reuniões; abandonemos este manto de ordem e saltemos de volta para as charnecas, e os pântanos e as colinas; de volta à floresta e às clareiras da noite! de volta aos deuses antigos e aos lábios corados de Pã!

Como as tochas tremulam na tempestade, pressionando beijos calorosos de ouro nos troncos retorcidos e nodosos das faias! Como a fumigação do almíscar e da mirra gira em uma nuvem aromática do incensário brilhante! – como por um tempo ela se apega avidamente aos galhos, e então é levada às estrelas! Olhe! – conforme os invocamos, como eles se reúnem em torno de nós, estes Espíritos de Amor e de Vida, de Paixão, de Força e de Abandono – estes tendões da virilidade do Mundo!

Ó mistério dos mistérios! “Pois cada um dos Deuses está em todos, e todos estão em cada um, estando inefavelmente unidos uns aos outros e a Deus; porque cada um, sendo uma unidade super-essencial, sua conjunção é uma união de unidades”. Portanto, cada um é tudo; assim, a Natureza esbanja o ouro e a prata de nosso entendimento, até que em pânico e frenesi batemos nossas cabeças nas pedras lavadas pela tempestade e nos troncos destruídos, e gritamos: “Io… Io… Io… Evoe! Io… Io!” até que as clareiras vibrem como com a música da siringe e do sistro, e nossas almas se partam nos chifres flamejantes de Pã.

Venham, ó crianças da noite da Morte, despertai, levantai-vos! Vede, o sol está acenando no Oeste, e nenhum dia de primavera está próximo nesta terra de sonhos murchados; pois tudo está opaco com o suor da escuridão e sombrio com a indústria do Mal! Acordai! Ó, acordai! Vamos subir até o cume das montanhas solitárias, pois logo um sol nascerá em nós, e então seus picos brancos se tornarão dourados, carmesim e púrpura como os seios de uma mulher poderosa inchados com o sangue e o leite de uma nova vida. Lá, entre aquelas colinas distantes de ametista, encontraremos a bela amante dos desejos de nosso coração – aquela Mãe generosa que nos abraçará em seu peito.

Suas são as florestas sem limites e as colinas e o roxo distante do horizonte. Chame, e eles responderão a você; peça, e eles derramarão sobre você o espólio acumulado dos anos, e todos os tesouros das eras; de modo que ninguém ficará em necessidade e todos possuirão tudo no anseio de todas as coisas. Venha, vamos quebrar a abóbada da Circunstância e as paredes da masmorra da Convenção, e de volta para Pã nos pântanos emaranhados, e para a beleza sutil da Feiticeira, e para os jovens pastores – de volta para os rebanhos brancos no lado da colina, de volta a Pã – a Pã – a Pã! Io! a Pã.

Sob o visco e o carvalho não há risadinhas no banco da capela, nem sorriso de desejo lascivo na sala de estar, nem estalar de lábios lascivos sobre a carne quente e a pele branca da vida; mas um grande grito de riso alegre surge, que faz os ventos oscilarem para fora de seus cursos designados, e sacode os galhos mortos dos ramos folhosos acima: ou, tudo é solene e calmo como uma noite sem sopro; pois aqui a vida é sempre forte, seja em tumulto ou em repouso.

Aqui não há comércio, nem usura, nem contagem dos ganhos e perdas de vidas; e o grande Semeador salta sobre os campos como um louco, lançando os grãos dourados entre as sarças e nas rochas, bem como entre os sulcos negros da terra; pois cada uma deve arriscar e lutar até a vitória em virilidade e força. Aqui não há seita nem facção: viva ou morra, prospere ou decaia! Assim os grandes vivem e os pequenos voltam às raízes da vida. Nem sua obediência está fora da obediência que nasce da Necessidade; pois aqui não há suporte, não há descanso sobre os outros – relhas de arado são transformadas em espadas e hastes em forma de flechas, e os ventos guincham através de nossa armadura enquanto lutamos pela força do Mundo.

A chuva cai igualmente sobre os desertos e sobre os vales férteis; e o sol brilha igualmente sobre as águas azuis e sobre os campos verdejantes; e o orvalho não se importa onde dorme, seja na colina de esterco, ou entre as pétalas da rosa selvagem; pois tudo é pródigo neste Templo do Mundo, onde no trono de riquezas inesgotáveis está o Rei da Vida, arrancando as joias de sua garganta dourada e lançando-as aos ventos para serem carregadas aos quatro cantos da Terra. Não há economia aqui, não há armazenamento para amanhã; e, ainda assim, não há desperdício, nem luxúria, pois todos os que entram nesta Tesouraria da Vida tornam-se um com as joias do tesouro.

Palavras! … palavras! … palavras! Eles algemaram e acorrentaram vocês, ó crianças das brumas e das montanhas; eles os aprisionaram e os cercaram no calabouço de uma razão sem luz. A fantasia foi queimada na fogueira do Fato; e a imaginação presa nos ferros do delito e do sofisma. Ó vaidade de palavras vãs! Ó arte astuta e enganadora! Agilmente os grandes de hoje lutam com o hálito malcheiroso de suas bocas, torcendo e contorcendo-o em seduções, bastardizando e corrompendo a essência das coisas, sugando como um vampiro ganancioso o sangue dos seus corações e soprando em suas narinas os rígidos símbolos da lei e da ordem, gerados no leito de morte de seu entendimento.

Ó crianças da Maravilha e da Fantasia, fujam para os bosques selvagens enquanto ainda há tempo! De volta aos mistérios dos carvalhos sombrios, à revolta da imaginação, à insurreição das almas, aos festivais de amor iluminados pela lua: de volta onde o lobisomem se esconde e os libertinos da lua rondam. De volta, ó, de volta à canção da vida, de volta ao grande Deus Pã! E ali, envoltos em suas peles de cabra, bebam com os pastores de Tamuz da pele de um bebê ainda não nascido, e vocês se tornarão como as águas cintilantes de prata de Istar – puros e brilhantes! Depressa, pois ele é o rei divino dos faunos e dos sátiros, das dríades e das oréades; o Senhor das Coroas; o Decisor do Destino; o Deus que prospera acima e abaixo! E não demoreis, para que, ao vagardes ao longo da costa do Mar Jônico, ouçais uma voz de lamentação chorando: “O Grande Pã está morto!”


Traduzido por Alan Willms em 2011; atualizado e anotado em maio de 2023. Foto ilustrativa de Giorgio Trovato no Unsplash.

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